De Drácula ao heavy metal: as curiosidades sobre Christopher Lee

Christopher Lee

Stefano Pfitscher

Um dos maiores nomes da história do cinema de horror, o ator britânico Christopher Lee, morreu no último domingo, 7, aos 93 anos, vítima de insuficiência cardíaca e respiratória. Ele estava internado há semanas e o anúncio foi feito só nesta quinta-feira por decisão da família. Lee era o último de uma série de ícones que marcaram o terror e hoje é mais lembrado por seu papel nas franquias O Senhor dos Anéis e Star Wars. No entanto, sua longa vida, dentro e fora das telas, foi marcada por curiosidades e detalhes que só engrandecem a complexa figura que foi Christopher Lee.

Nascido de uma família nobre de Londres em 1922, Christopher Frank Carandini Lee deixou a Inglaterra em 1939 para lutar pelo exército finlandês durante a Guerra do Inverno (sim, esse foi um conflito real, não uma coisa do Game of Thrones) e, em seguida na Segunda Guerra Mundial – onde, segundo o ator deixou entender, matou um nazista com uma punhalada. Acalmem-se, as curiosidades nem começaram.

Ao final da Guerra, Lee foi perseguir sua vocação como ator fazendo pequenos papéis em grandes produções como Hamlet (1948), com Laurence Olivier no papel título, e O Pirata Sangrento (1952), onde contracenou com Burt Lancaster. Espadachim de mão cheia, Christopher Lee nunca usou dublês para cenas de duelo tanto que, em O Príncipe Negro (1955) sofreria um acidente que o marcaria para sempre. Após terminar uma cena com o dublê do protagonista, Errol Flynn, o próprio astro entrou para filmar sua parte, mas sua inexperiência com espadas – e o fato de estar um pouco bêbado – o fez resvalar e atingir Lee em uma das mãos. Mais tarde, Lee chamaria o dedo torto em sua mão direita de “um presente de Errol Flynn”. Hoje, Christopher Lee é creditado como o ator que mais participou de duelos de espada na história do cinema.

Em 1957, Christopher Lee se associaria com uma pequena produtora britânica e deixaria seu nome na história ao produzir o que é considerado um dos primeiros filmes de terror em cores: A Maldição de Frankenstein (1957). Nele, iniciaria um ciclo que entraria para a história do gênero: o ciclo dos filmes de terror Hammer. A produtora faria fama com inúmeras fitas que apelavam para o erotismo e enalteciam o vermelho do sangue derramado pelos personagens, hoje objeto de culto para os interessados pelo tema.

CHRISTOPHER-LEE- frankenstain

Nelas, a dinâmica era sempre a mesma: Christopher Lee interpretava algum tipo de ameaça sobrenatural e seu amigo pessoal e companheiro de tela, Peter Cushing, fazia um herói tentando impedi-lo. Isto nunca ficou mais evidente do que em O Vampiro da Noite (1958), em que Lee faria história como uma versão selvagem e sedutora do Conde Drácula. A produção, o maior sucesso da história da Hammer, foi a responsável por alçar Lee ao estrelato, o associando para sempre com a imagem do vampiro. Conta ele que, quando foi chamado para protagonizar a sequência, Drácula, o Príncipe das Trevas (1966), recusou de imediato o papel, por achar o roteiro muito fraco, porém, em seguida acabou aceitando pois foi chantageado pelos produtores que lhe disseram que, se não aceitasse, toda a equipe ficaria sem emprego. O ator faria mais cinco continuações depois dessa, tendo interpretado Drácula ainda em filmes como Conde Drácula (1970), do rei do cinema B, Jesús Franco, e na comédia francesa Drácula, Pai e Filho (1976).

Grande fã das fitas da Hammer, George Lucas chamaria os dois astros da empresa para fazer participações na saga Star Wars: Peter Cushing faria Grand Moff Tarkin no Guerra nas Estrelas (1977) original e Lee seria Conde Dooku em Ataque dos Clones (2002) e A Vingança do Sith. O nome do personagem de Lee, que seria mudado para Conde Dookan na versão brasileira para evitar a rude cacofonia de sua leitura em português, é uma alusão a seu papel mais conhecido nos filmes da Hammer.

Tanto Lee quanto Cushing ficariam presos ao gênero por décadas, se associando muitas vezes com outro ícone: Vincent Price, com quem formariam o famigerado “Trio do Horror” na década de 1970. Nessa época, estrelaria O Homem da Palha (1973), considerado pelo ator um dos seus papéis preferidos no gênero, e trabalharia com Steven Spielberg em 1941 – Uma Guerra Muito Louca (1979).

Christopher Lee em DRÁCULA

Drácula, o Príncipe das Trevas (1966)

Um dos papéis mais marcantes de sua carreira viria em 007 Contra o Homem da Pistola de Ouro (1974) onde enfrentaria a versão de Roger Morre do personagem como o excêntrico milionário de três mamilos Francisco Scaramanga. Mas sua relação com James Bond não começara ali: Christopher Lee era primo por parte de mãe do criador do agente secreto, Ian Fleming, que o escolhera pessoalmente para o papel do vilão em O Satânico Dr. No (1962), mas os produtores acabaram dando o papel para Joseph Wiseman.

Nos anos 1980, Lee se despediria de Peter Cushing e Vincent Price na comédia de horror A Mansão da Meia-Noite (1983), cantaria músicas absurdas na produção australiana The Return of Captain Invisible (1983) e reencenaria a Revolução Francesa em La Révolution Française (1989). Sua ligação com o cinema internacional não é surpreendente já que o ator falava fluentemente cinco línguas: inglês, francês, italiano, alemão e espanhol – e se fazia entender em russo, sueco e grego.

Na década de 1990, Lee faria papéis ainda mais improváveis como o vilão de Loucademia de Polícia 7: Missão Moscou (1994), como jurado no concurso de Miss Universo de 1995 e ganharia reconhecimento crítico como o fundador do estado do Paquistão em Jinnah (1998), que considerava seu filme mais importante. Lee ainda iniciaria uma série de parcerias com um de seus fãs mais ilustres, Tim Burton, em A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça (1999).

Porém, foi na década de 2000 que o ator se reinventou quando foi chamado por Peter Jackson para interpretar Saruman, o Branco, nos filmes que comporiam a trilogia O Senhor dos Anéis (2001-2003). Fã de longa data da clássica série literária, Christopher Lee foi o único envolvido na produção que conhecera o autor J. R. R. Tolkien pessoalmente, tendo o abordado na juventude em um pub de Oxford. Segundo o ator, sua fascinação pela obra de Tolkien era tanta que ele criara o costume de ler a trilogia do Anel uma vez por ano. E foi sua própria admiração pelo autor que o levou à franquia cinematográfica, tendo insistido com o diretor Peter Jackson para que o escalasse no papel de Ganfalf, o Cinzento. Lee acabou sendo apresentado a toda uma nova geração de fãs como o mago Saruman, o Branco.

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Em Star Wars e Senhor do Anéis.

Sempre interessado em música, Lee descobriu, tarde na vida, uma carreira no heavy metal. Em 2005, fez um dueto com o vocalista da banda italiana Rhapsody of Fire, Fabio Lione, na faixa The Magic of the Wizard Dream. Em seguida, Lee participaria como narrador em quatro álbuns da banda. Ele também gravaria com a americana Manowar, em um relançamento de seu primeiro álbum, Battle Hymns (1982), fazendo o narrador originalmente interpretado por Orson Welles.

Naquela mesma década, sua parceria com Tim Burton continuaria em filmes como o remake de A Fantástica Fábrica de Chocolates (2005), A Noiva Cadáver (2005) e Alice no País das Maravilhas (2010). Em 2011, foi o próprio cineasta quem entregou a Lee o prêmio honorário do BAFTA, o Oscar do cinema britânico. Ator e diretor trabalhariam juntos uma vez mais, na mal-sucedida novela sobrenatural Sombras da Noite (2012).

Na década de 2010, já debilitado pela idade, Christopher Lee participaria da sequência de O Homem da Palha, The Wicker Tree (2011) e trabalharia com Martin Scorsese em A Invenção de Hugo Cabret (2011), além de reprisar seu papel como Saruman na trilogia O Hobbit (2012-2014).

Em 2010, o ator londrino lançaria seu primeiro álbum solo, Charlemagne: By the Cross and the Sword, recontando em formato de ópera sinfônica a vida de Carlos Magno. Por este trabalho, Lee recebeu o prêmio Metal Hammer, o maior da indústria do heavy metal e em 2012 lançou uma sequência: Charlemagne: The Omens of Death, no dia em que completou 91 anos de idade.

Christopher Lee deixa dois filmes ainda não lançados, Angels in Nothing Hill e The 11th, uma filha e uma legião de fãs inconsoláveis.

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