Fabrício Silveira
New Dawn Fades não é uma grande produção teatral. Na verdade, é uma encenação modesta, quase simplória. Não há iluminação inventiva nem há efeitos ou recursos plásticos que saltem aos olhos. Não há elementos decorativos. Ao contrário, há um despojamento franciscano. É um espetáculo tímido. Nas laterais do palco, há algumas cadeiras que são constantemente removidas e recolocadas em cena. Há alguns acessórios, aqui e ali, alguns equipamentos musicais – um minúsculo kit de bateria, dois amplificadores, o pedestal de um microfone, um contrabaixo e uma guitarra em seus suportes. Pouco além disso.
Na frente do público há um telão suspenso, afixado na parede de fundo do cenário. Ali serão mostrados os vídeos que irão pontuar a narrativa, intercalando-se às ações encenadas. Assim, através das imagens da Granada Television, a trama vai sendo composta e ilustrada. Há um forte elemento jornalístico na narrativa. Tony Wilson é tomado como o grande narrador, a testemunha ocular perfeita, o único sujeito legítimo, o único capaz de conduzir a história. Wilson adere à trama. Faz comentários. Faz piadas. Sublinha depoimentos. Quebra a “quarta parede”. Contém o ritmo dos fatos que levaram ao suicídio de Ian Curtis, em 18 de maio de 1980.
Em contraponto, os figurinos são fiéis e bem cuidados: a manta e o elegante sobretudo de Mr. Manchester, os óculos equilibrando-se na ponta aguda do nariz, dando-lhe um ar inquisitivo e afetado, agravado pelos trejeitos e o tom de voz; a gravata preta finíssima, a camisa branca arremangada, os jeans com a barra dobrada de Bernard Sumner; a indefectível leather jacket de Peter Hook.
Curtis é um boneco de pano, as calças acima da linha da cintura, os tornozelos à mostra, os braços descoordenados. Às vezes, se comporta como um poeta apavorado, um acanhado irredutível, sensível como poucos. Às vezes, é irascível e violento. Às vezes, vai ao chão, se debatendo, convulsivo.
O teatro estava lotado. O público entrava e saia, conforme terminavam as cervejas que bebiam, durante a encenação. Os playbacks eram impressionantemente bem executados. Era quase como se estivéssemos revendo-os tocar ao vivo. No mínimo, era como se estivéssemos assistindo o filme Control, dirigido por Anton Corbijn, em 2007. A triste história do Joy Division parecia estar se repetindo, flagrada mais uma vez, nos mesmos detalhes que já conhecemos, os ingredientes míticos: um jovem casal apaixonado, Macclesfield, uma pequena cidade do interior, um vilarejo rural, frio e depressivo. Subitamente, então, um show de rock, um sopro de futuro.
“No future. No future for you”.