Oly Jr. | Frank, Paul e o provincianismo

Oly Jr.

Sou daqueles que fico incomodado quando insistem em dizer que Porto Alegre é uma cidade provinciana, em tom pejorativo. Eu confesso que tal adjetivo me entra rachando a cuca. Como adjetivar alguém de caipira, no sentido pejorativo, pra chamá-lo de jeca, matuto, ignorante e por aí vai. Primeiro: nessa altura do campeonato, particularmente, se tivesse oportunidade, e se houvesse possibilidade de muitos cidadãos terem uma máquina do tempo, assim como um automóvel, eu tiraria férias todo o ano pra algum lugar no passado porto-alegrense, no tempo que ela realmente era uma província. Segundo: eu não entendo o provincianismo, ou o caipirismo, como adjetivos de depreciação.

Entendo apenas como outra forma comportamental, associado a uma outra noção de tempo/espaço. Tempo esse, que nos falta em detrimento da ânsia por desenvolvimento e enriquecimento, e espaço esse, no sentido físico, que não temos mais. Bens preciosos que deixamos escapar: a locomoção pela cidade num curto espaço de tempo (em relação à hoje), o tempo real com os amigos, e as brincadeiras de rua das crianças. E daria pra fazer uma lista de 100 coisas, tranquilamente. Muitas províncias européias são mais organizadas em termos políticos e sociais, que muita cidade/estado, por exemplo. Sendo assim, o problema de Porto Alegre, e de outras tantas cidades, não sugere o provincianismo político, ou o pensar provinciano da população.

O problema é justamente o contrário. É o pensamento liberal, elitista e mesquinho. Conheço gente que sonha em morar numa província gaúcha, ou em outro canto do Brasil, ou canadense, norte-americano, inglês, escocês… enfim. Então, essa coisa de generalizar um julgamento quase sempre é um tiro no pé. Particularmente, eu tenho saudades de uma Porto Alegre muito mais provinciana que hoje em dia. O desenvolvimento urbano e tecnológico tirou muito da qualidade de vida da cidade.

Aliás, um provinciano tocou pela segunda vez na cidade. Um garoto de Liverpool. Cidade portuária da velha Inglaterra de guerra. Um artista que curte tomar um chá, andar de transporte coletivo, sendo um defensor da mobilidade sustentável. Baita provinciano. De quem estou falando? Sir Paul McCarteny, ora!

O interessante é que muitos ranzinzas porto-alegrenses, que não podem passar por um contratempo urbano, uma falta de possibilidade, uma encrenca política, que já adjetivam a cidade de provinciana, ficaram felizes com a abertura do show do chapa Frank Jorge, acompanhado de outro chapa, Luciano Albo, inclusive entrando na brincadeira virtual, ou de mesa de bar, de que o Macca fecharia o show deles, sentindo o cutuco de tocar depois de “Amigo Punk”, ou “Sob um Céu de Blues” (afinal, eles foram os Cascavelletes). Nada mais provinciano. E eu adoro isso!

E quer saber? Eu fui no primeiro show do Paul aqui na cidade. Curti. Estava bem acompanhado de amigos, e com a minha esposa grávida do nosso primeiro filho. Não sou um fã do cara, por assim dizer. Sou um apreciador de suas obras. Cantamos e nos emocionamos. Pra mim tá tri. Já deu. Mas não me conformo de ter perdido o show do Frank com o Albo nessa ocasião. Era o que eu realmente queria ter visto. Bueno, vou lá ouvir o burburinho provinciano sobre os shows. Que beleza!

OLY JR.
Músico/compositor auto-didata, atuante desde 1998 e ganhador de 4 Prêmios Açorianos de Música. É o autor da fusão “Milonga Blues”, misturando a milonga latino-americana com o blues norte-americano. Atualmente, além da carreira como músico, é estudante de curso de Música do IPA.

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