Entrevista | Supla: 50 anos dizendo o que pensa

(foto: Mateus Mondini)

(foto: Mateus Mondini)

Em abril deste ano, Eduardo Smith de Vasconcelos Matarazzo Suplicy, o Supla, completou 50 anos de vida. Como se isso não bastasse para tornar 2016 um ano especial, o artista também celebra suas três décadas de carreira, lançando um livro de crônicas e um disco novo, solo, depois de sete anos tocando ao lado do irmão, João Suplicy, no projeto Brothers of Brazil, que resultou em três álbum lançados pela gravadora de Los Angeles SideOneDummy Records.

Nesta semana, um solícito e disposto Supla nos atendeu por telefone e conversou com a reportagem do Culturíssima por cerca de 40 minutos. O músico falou com empolgação do seu oitavo álbum solo, intitulado Diga o que você pensa. Supla e seu produtor Kuaker gravaram todos os instrumentos, exceto em Amigo, que tem a participação de Eduardo Ardanuy. São 13 músicas autorais em que Supla divide algumas composições com seus amigos Tatiana Prudencio Torrez, Fabio Bopp e a norte-americana Victoria Petrusky. “É um álbum que é bem a minha cara. É um dos que consegui dar mais a minha cara”, definiu.

Nunca acomodado, Supla já vez cinema, televisão, reality show, iniciou a carreira na banda Tokyo, e quando morou em Nova York formou a Psycho 69. Ao todo, na carreira já são 14 álbuns, e agora um livro. Neste ano, o músico paulistano, filho dos políticos Marta e Eduardo Suplicy, lançou pela Editora Ideal Supla – crônicas e fotos do Charada Brasileiro, com 50 textos escritos pelo próprio, falando de fatos e passagens de sua carreira. “Tive vontade de escrever para deixar registrado pra mim mesmo, as coisas que passei, sabe? Recomendo isso pra todo mundo, dar uma volta nas páginas da sua vida”, contou.

No papo, Supla ainda falou da importância de seguir fazendo coisas novas, como imaginava que chegaria aos 50 anos e também sobre a situação política do Brasil, alfinetando o juiz Sérgio Moro pela polêmica foto ao lado do senador Aécio Neves. Confira:

Culturíssima: Você acaba de lançar Diga o que você pensa. Como está sendo este retorno à carreira solo?

Supla: Pra mim é gratificante. Toco algumas músicas dos Brothers no show também, porque fazem parte da minha carreira. Ter tocado com o João esses sete anos, foi muito bom. Aí a gente decidiu dar um tempo, então escrevi um livro, e pensei: como vou fazer música agora? Porque a gente fazia tudo junto. Eu não tenho guitarrista, não tenho um pianista ou tecladista. Decidi então focar bem no meu violão e fazer as canções ali. Tendo uma boa letra, dizendo algo que realmente eu acredite, algo que ache relevante, com uma boa melodia… se a música estiver indo bem só assim, está ótimo. Aí vou entrar no estúdio, gravar ela só com o violão e uma batida, um metrônomo, para marcar o tempo, e aí vou construir a música a partir disso. O tempo dela vai estar lá e posso fazer a batida que quiser. No álbum, tem várias baterias eletrônicas e várias acústicas, misturadas. Aí as músicas falam por si só, tanto em Parça da Erva, como em Anarquia Lifestyle, como o próprio álbum. Foram cinco singles. Em Amor entre dois diferentes tem a participação de uma cantora nova, chamada Isa Salles, e essa música, por exemplo, quando digo coisas relevantes, ela não é só uma música de amor, ela diz muito mais do que uma relação. Ela celebra a diversidade no amor. Até uma música sobre o Donald Trump tem.

Então, qual a história dessa música? Na época que você compôs ele ainda era pré-candidato, e agora ele ganhou. Como você encarou essa vitória?

[Canta o trecho inicial da música] Trump! Trump! Trump! Never gonna live at the White House. Trump! Trump! Trump! Never gotta leave Trump Towers! Eu falei que ele não ia ganhar, mas ele ganhou, esse filho da mãe. Cara, até o Roberto Justos é candidato a presidente. E o Doctor Rey [risos]! É isso aí, mano! I do not know, man. Muito louco, né? Os caras já cuidam do próprio dinheiro, e agora querem poder na política também.

Essa música eu fiz quando vi o Trump em um programa de televisão, nos EUA, falando que se ele estivesse na Quinta Avenida [em NY] e desse um tiro em uma pessoa, ainda assim seus eleitores continuariam votando nele. Pensei ‘puta, olha a mensagem que esse cara está passando’. Então sei lá, fiz uma música, e fui até a Trump Tower tirar foto, com peruca e tudo. Mas cara, como cidadão do mundo, tento ser positivo. Tem que ficar em cima, mas tento ser positivo, pra não acontecer uma tragédia maior. Torço para que ele não faça as coisas que ele prometeu. Ele já diminuiu bem o tom.

Na verdade, a nossa sociedade está muito ligada ao individualismo. A gente está muito individual mesmo. Eu sinto muito isso, não sei se você sente. Essa necessidade de estar sempre mostrando o que estou fazendo. É uma mentira isso, toda hora estar mostrando que está bem, que está maravilhoso e tal. Faço isso por causa do meu trabalho, se não me sinto fora do pacote, mas é uma tristeza ter que ser assim.

Esse é um dos temas que você aborda no disco. Você acha que Diga o que você pensa é um dos teus trabalhos mais maduros em termos de letra e composição?

Cara, quem tem que dizer isso é o público. Posso dar a minha opinião, mas… Acho que essas letras estão bem atuais com tudo o que está acontecendo, e está um álbum feliz musicalmente. Tentei – sempre tento – ser o mais eu possível, das minha influências eletrônicas dos anos 80. É muito visível isso no álbum. Até da bossa nova. O Parça da Erva é uma bossa nova. É um álbum que é bem a minha cara. É um dos que consegui dar mais a minha cara, porque quando tocava na banda americana Psycho 69, não era só a minha cara, tinha todo mundo também. A Tokyo também. O Brothers, é bem a cara do meu irmão. Então, as letras [ de Diga o que você pensa] são de um artista que está falando muito do que está acontecendo. Uma vez vi o Frejat dizer que o rock tinha parado de falar, quem falava hoje era o hip hop, falei: “Então você não está acompanhando o meu trabalho, meu filho!”. Estou falando um monte nas letras.

Você está celebrando 30 anos de carreira. Não está faltando uns anos nesta conta [risos]?

[Ri alto] Não, comecei profissionalmente mesmo em 1986, quando lancei o primeiro álbum. Mas já estava tocando na noite de São Paulo com 14 anos, conto isso no livro. Estou tocando há muito tempo, mas profissional é isso mesmo, faz 30 anos.

Cara, esse jovem Supla de 1986, como ele se imaginaria aos 50 anos? E hoje, como você acha que vai ser aos 60?

Aí você me pegou. Mas agora, eu imaginava assim mesmo. Tem uma reportagem antiga, que tem umas fotos minha fazendo capoeira, com uma calça de fogo, e falo isso. Tinha 19 ou 20 anos, e vi o Mick Jagger pulando, já mais velho: “porra, também vou estar assim quando estiver velho”. Então me imaginava assim, com certeza. Agora, daqui a 10 anos, não consigo imaginar. Se tiver essa energia que eu tenho, vou continuar fazendo o que estou fazendo. A energia está boa ainda.

O projeto Brothers of Brazil só deu uma tempo ou vocês consideram encerrado?

Só o tempo vai dizer. Foram três álbuns. Um que foi um sucesso, que deu a abertura para tocar fora do Brasil. De verdade, não marcar uns shows e ir lá tocar. Não. Fomos pra fazer uma turnê de verdade, dar entrevista de verdade, né? E depois teve dois álbuns, que fizeram mais sucesso no Brasil, porque o primeiro disco ninguém entendeu nada. Acho que era uma coisa muito pra gringo ver, talvez. E teve gringo que entendeu e gringo que não entendeu. Pelo menos consegui fazer alguma coisa diferente e que teve algum reconhecimento. Tentar fazer alguma coisa diferente, isso que é punk pra mim, musicalmente. Você pode bater na trave, mas pelo menos está tentando.

Tem muito cara que passa a vida toda cantando uma música.

Não é o meu caso. E sei que tem muito vendedor de show que fala: “Não, ninguém quer escutar suas músicas novas. Pessoal quer escutar Garota de Berlim, Japa Girl”. Falei “você é um imbecil, é totalmente ao contrário”. Pô, Parça da Erva é destaque no Deezer e essas coisas, nesses canais virtuais, por quê? Isso não foi porque paguei nada, foi porque foi. Porque é uma boa canção, com uma boa melodia, dizendo algo, e que vai despertar uma ira, ou uma coisa boa. Vai despertar alguma coisa, vai fazer você pensar. Música é um negócio muito louco. Você escuta e ela mexe com pessoas. Bandos, tribos de pessoas vão para lugares, escutar determinado tipo de música e se ver naquele lugar. Estilo de roupa… caminha tudo meio junto.

 Você escuta e busca bastante coisas novas?

Você acredita que sim? Hoje mesmo escutei algumas coisinhas novas e tal. Sou uma pessoa que fica cavocando. É importante. Esse meu disco teve muita “cavocação”, de pesquisa de som, de música contemporânea, música meio minimalista ou pop mesmo.

livro supla

Como surgiu  ideia de escrever um livro de crônicas? Você considera uma biografia ou um livro de memórias?

Bem, primeiro a ideia. Fiquei meio assim de lançar um livro, porque todo mundo está lançando. E eu adoro ler, tenho um monte de biografia aqui em casa. Aí, puta, mais um “manjadão” lançando livro, mas vamos lá, pelo menos deixa registrado. Me faz lembrar até o Frank Zappa, que perguntaram como ele queria ser lembrado. Ele falou: ser lembrado pra que? Acho isso engraçado, como a própria atitude do filho do Malcom McLaren que tacou fogo em seu acervo. O que você achou? Por um lado, achei muito bom. Mas voltando, falando do livro. Tive vontade de escrever para deixar registrado pra mim mesmo, as coisas que passei, sabe? Recomendo isso pra todo mundo, dar uma volta nas páginas da sua vida. São 50 crônicas, não é muita coisa. E 50 por causa dos 50 anos.

Fui parando de tocar com meu irmão e já lancei esse livro, e aí fui lançando também os singles do álbum, junto com o livro, até lançar o disco agora no final do ano. Os próximos projetos são esses mesmo, continuar tocando. Vai sair novo clipe nos próximos dias, da música Extremistas Fundamentalistas, que me lembra muito os anos 80, meio pós-punk, desde o verso, tem um baixo bem pesado, toco uma conga muito louca em cima da bateria, e depois entra no refrão uns violinos, e imagino como se soldados ingleses estivessem sendo atacados por tropas sírias, com tambores rufando, ao som de tímpanos batendo. Isso são sons que estão na própria canção. A música foi montada assim, de acordo com a letra.

Mais no início do ano, você foi manchete se posicionando contra o impeachment da Dilma, portando ficando ao lado do teu pai, e indo contra a posição política da tua mãe [Supla interrompe]…

O meu pai é meu pai, minha mãe é minha mãe e eu sou eu. Tudo bem, meu pai tem a opinião dele e eu tenho a minha, e minha mãe tem a dela. Não vou nem contra nem a favor. É só minha opinião, e minha opinião é essa. Você vê como está saindo as bombas aí. O Serra recebeu isso, o Kassab recebeu aquilo, o Alckmin… Está no jornal! E o Moro, está lá trocando uma ideia com o Aécio? Como um cara que é juiz, está lá recebendo um prêmio da IstoÉ Dinheiro? Rockstar sou eu, filho! Você é juiz. É diferente, saiba sua posição, caso contrário já fica sem moral. Aí fica parcial, e não pode ser. Pô, só foi uma fotinho. Não tem essa, fotinho é o caralho! Então tem que tirar fotinho com o Lula ou com o José Dirceu, sei lá.

Esses dias fui cantar na FEBEM [Fundação Casa] com meu pai. Cantei umas músicas do novo álbum, e gostaram bastante. Mas é muito triste, não tenho a solução, só acho que quando uma pessoa menor de idade, vai para a prisão assim, fica marcado para o resto da vida. Lógico que tem os “sangue-ruim”, não tem jeito, tem gente que é ruim mesmo, mas com o número dinheiro que já roubaram nesse país, que levaram pra lá e pra cá, isso ia diminuir o número de pessoas na cadeia. Porque se você tem uma opção melhor, você tem mais possibilidades de não ir para o lado ruim. Isso é nítido, é muita grana que foi roubada. Até me pergunto, quando vejo um político rico, que gasta a maior grana para se eleger, ele podia pegar esse dinheiro, se quer ajudar mesmo, já pega e ajuda esse monte de gente passando fome. Já vai ajudar bastante.

Tem um termo aqui no RS, que é quando a rádio cobra para tocar a música do artista. Chamamos aqui de jabá. Não sei se aí é a mesma expressão, mas já aconteceu contigo?

Isso existe. Mas eu trato assim: toca o meu som, sou da velha guarda, gosto de escutar minha música no rádio, e aí faço um show de graça pra você. Acho justo e tem funcionando bem, porque a rádio promove o seu show e beleza, toca a sua música. É uma forma. Agora, cobrar dinheiro não é correto. Mas conheço músicos que não fazem questão de tocar em rádio para não precisar fazer show de graça. O Brothers fez isso que estou te falando, e foi muito bom, super saudável.

Vocês ficaram dois anos na TV né?

É, mas isso até atrapalha. Televisão com música, o pessoal acaba não levando você tão a sério. Acho uma bobagem, mas tem gente que confunde, que acha que não está fazendo música séria. Lógico que tá. É um trabalho, mas que não tira a minha inspiração. O engraçado é que só fomos assinar com a gravadora americana quando o programa acabou. Parece que estava predestinado.

brothers of brazil_supla e joão

Brothers of Brazil

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