Especial | Expointer e a arte de gerar negócios

A feira de maior relevância para o estado é também celeiro de artistas e representa um período de safra para eventos culturais

Ópera Gaúcha Expointer (Foto: Luiz Chaves/Palácio Piratini)

Por Aline Luísa Bisol e Eduardo Brusch Muller

O balanço anual da Expointer foi publicado na terça-feira, 05, revelando os números de venda de animais, máquinas agrícolas e artesanato. Enquanto o agronegócio perdeu o embalo caindo 11% em relação ao ano passado, o artesanato obteve alta de 7%. Neste mesmo ritmo, as atividades culturais que, apesar de não constarem no relatório final, apontam faturamentos relevantes para artistas que também tocam a economia durante o evento.

Entre os mais de 450 eventos da Expointer, uma das atrações foi a mais esperada e de maior repercussão: o espetáculo Ópera Gaúcha. A encenação ocorreu no sábado, 26, após a abertura oficial do evento e rememorou os 40 anos de história da feira, somando no gramado da pista central cerca de 200 artistas. “Eu sonhei com isso, com os 40 gaiteiros, 40 bailarinos, tudo em alusão aos 40 anos da Expointer. Contei para o Elton Saldanha e tornamos realidade”, conta Marquinhos Kroeff, produtor cultural que concebeu a ideia. Além disso, Kroeff também captou, via leis de incentivo, verba de R$ 400 mil para 67 shows realizados no palco principal do Parque de Exposições Assis Brasil.

O espetáculo baseado na clássica Ópera Pampa argentina captou 80 mil reais para sua realização. Bailarinos, cavalarianos e músicos gaúchos encenaram o tema deste ano da feira: ‘O campo cria o futuro’. “A Ópera foi um sucesso. Já me pediram para levá-la para outros eventos. Isso é uma coisa interessante da Expointer, que ela segue dando retorno financeiro mesmo depois que termina”, comemora Kroeff.

Pequenas atrações, grandes negócios

Renato Borghetti (Foto: Luiz Chaves/Palácio Piratini)

O músico Renato Borghetti participou do espetáculo e de outros dois shows na feira. Mesmo com uma carreira consolidada, Borghetti ressalta que o evento gera frutos além do campo ou da mesa de negócios. “Sempre é bom participar da Expointer porque enquanto estamos aqui outras ideias vão se agregando e surgem novas oportunidades”, explica Renato. O acordeonista é um dos artistas de maior visibilidade do Brasil e vê na feira do agronegócio o caminho para a manutenção da cultura. “Eu fiz faculdade de veterinária, então me relaciono muito bem com esse ambiente. Acredito que aliar as marcas e empresas que estão aqui com bons músicos é fundamental”, afirma.

Renato mantém, em Barra do Ribeiro, a Fábrica de Faiteiros, onde são produzidas gaitas e jovens da comunidade aprendem a tocar o instrumento. Para a Ópera Gaúcha foram selecionados 40 alunos que se apresentaram ao lado de Borghetti em um momento que emocionou o público. O músico mantém o projeto com patrocínios e destaca a importância destas parcerias. “Do jeito que está o país e a cultura, é preciso ter aliados que deem essa sustentação financeira e essa visibilidade para os artistas”, finaliza.

Ensaiando rendimentos

Trio Peregrinos no Palco Principal da Expointer (Foto: Aline Luísa Bisol)

Os versos que exaltam o Rio Grande do Sul são tema recorrente no palco. “Precisa ter essa identidade com o contexto da Expointer, inclusive para atrair patrocinadores que visem posicionar suas marcas com a cultura gaúcha”, explica Kroeff. Ele comenta ainda que os cachês praticados na Expointer variam de R$ 500 a R$ 10 mil reais, dependendo da atração. O músico recebe o valor bruto, que ainda pode ser repassado ao seu staff, ou seja, a equipe que o acompanha, muitas vezes formada por motoristas, roaddie, maquiador, figurinista, entre outros. O Trio Peregrinos fez um dos shows no espaço e está em início de carreira. “Além de ser a vitrine máxima para o artista o cachê que é um dos melhores do ano”, comentam.

O retorno financeiro garantido pela participação na Expointer fez o pintor Alejandro Arnutti vir de Uruguiana, há 570 km de Esteio, para expor suas obras. O uruguaio vive na fronteira há dez anos e há quatro participa do evento. Suas telas hiper realistas retratam cenas do campo: animais, doma, paisagens do pampa, objetos de lida. “Cada ano fica melhor participar da Expointer porque aqui está meu púbico alvo e tenho me aproximado sempre mais dele”, comenta Alejandro, que além de quadros, também produz esculturas.

Pintor e escultor Alejandro Arnutti no estande da ANC (Foto: Aline Luísa Bisol)

Neste ano a Associação Nacional de Criadores — ANC, estande que cedeu espaço para Alejandro expor, premiou os melhores com troféus produzidos por ele que reproduzem cabeças de gado das diferentes raças concorrentes. “Foi um sucesso. Outras associações vieram falar comigo para fazer seus troféus para o ano que vem. Não é fácil viver apenas da arte, me sinto realizado pois a Expointer é meu faturamento principal”, comemora. A circulação de turistas de outros estados e até de outros países possibilita o acesso a novos mercados. Alejandro vendeu à um casal do Reino Unido um de seus quadros de maior valor, o que minimizou os gastos com a logística de passar 10 dias longe de casa.

Multipalcos

Os espaços que recebem artistas ganham incremento de público e até de vendas. O Gerente comercial, Jaisson Mota, trabalha na Sano Vitosan, empresa de nutrição animal, e acredita que os artistas agregam valor aos produtos e têm a oportunidade de também fazer negócios. “Muitos artistas do meio tradicionalista, que é o foco da Expointer, também possuem propriedades rurais e muitas vezes é possível aliar o faturamento com a música e o agronegócio. Temos orgulho de trabalhar com essa troca.”, salienta. O estande é tão conhecido pela movimentação artística que alguns músicos chegam com seus instrumentos voluntariamente para tocar. “Mesmo estes que não temos verba prevista para pagar cachê, conseguem retorno financeiro com convites para tocar em outros lugares pois têm visibilidade aqui”, comemora Jaisson.

A Expointer, uma das maiores feiras a céu aberto da América Latina não termina quando o último peão vai embora. Os projetos culturais, que necessitam de planejamento para aprovação e captação antecipada iniciam assim que a atual edição se encerra. Os artistas agradecem o público sempre desejando que no ano seguinte possam voltar àquele palco e esperançosos que a visibilidade atraia novos contratos. Domar as rédeas financeiras da vida artística não é tarefa fácil, mas para muitos o evento máximo do agronegócio rege não só notas de dinheiro, mas também as de uma melodia de estabilidade financeira.

Matéria produzida por Aline Luísa Bisol e Eduardo Brusch Muller para a cadeira de Jornalismo Econômico do curso de jornalismo da Uniritter. Texto originalmente publicado no Medium da disciplina. Material cedido pelos autores.

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