O rock n’ roll dançante dos Rolling Stones

Vinícius de Macedo Berghahn

Eric Clapton conta em sua biografia que certa feita estava perambulando pela noite de Londres quando resolve entrar em um pub aleatório e de repente descobre que a banda da noite era os Rolling Stones. Simples assim, como que resolve tomar uma cachacinha Velha Chica no 512 e por acaso assiste a um show da Legião Urbana, guardadas as devidas proporções.

Que maravilha seria poder assistir os Rolling Stones assim num pub para no máximo 200 pessoas. Não porque poderíamos ver a maior banda da atualidade de perto, mas porque poderíamos ouvir um repertório vasto, que incluísse lados B, e quando o show não estivesse lá tão animado assim, teríamos a oportunidade de ir no banheiro e pegar mais uma cerveja para poder dançar ainda mais quando o pancadão voltasse.

rolling stones porto alegre

Não tem muito o que dizer sobre um show dos Rolling Stones, eles são os Rolling Stones e isso basta. Todo mundo conhece a excelência musical de cada um deles e sabe da amizade que supera os egos e lhes confere um entrosamento raro. Todo mundo sabe que eles são incríveis e (quase) irreparáveis. Todo mundo sabe que eles são os Rolling Stones.

Vejamos por outro lado então. Vejamos não como uma simples banda de rock, mas como uma banda que faz rock para dançar. Pular também, mas para dançar como se estivesse em uma boate ouvindo Britney Spears. Não é por acaso que ao vivo as músicas estendem-se muito além da letra, não para ouvirmos solos de guitarra, mas para continuarmos dançando. No palco, as músicas dos Stones não se resumem a uma letra, um solo, refrão e fim apoteótico, como todas as bandas de rock. Algumas canções não são nem encerradas propriamente, simplesmente terminam porque eles percebem que já-deu-pra-dançar-bastante-então-vamos-passar-para-a-próxima-porque-ninguém-aguenta-dançar-a-mesma-música-ou-a-mesma-levada-a-noite-toda.

Assim como no show de Copacabana em 2006, a abertura foi com Jumpin’ Jack Flash. Mesmo que a versão ao vivo não tenha o anúncio do apocalipse profetizado antes do início do riff com o contundente “Watch it!”, esta é a música ideal para quebrar o gelo e fazer todo mundo pular. Melhor até do que se resolvessem abrir com Start Me Up ou Satisfaction. Logo em seguida vem It’s Only Rock ‘n’ Roll (But I Like It), um grande sucesso, mas com potencial menos dançante se você não estiver um pouco bêbado. Depois veio Tumbling Dice que também deixou a desejar no quesito dançante e teve inclusive Mick Jagger pedindo para Charlie Watts dar uma pequena aceleradinha no final.

Então, Out Of Control. Ninguém pulou em Out Of Control. Mas é uma música calma, não é pra pular. É sim. Out of Control é tensa, ela anuncia que alguma coisa está para acontecer e você fica o tempo todo esperando por isso e quando chega no refrão e a coisa acontece ninguém entende isso, ninguém pula e a plateia decepciona. Depois vem Let’s Spend The Night Together e Ruby Tuesday e a plateia enlouquece com Paint It Black. Particularmente eu não gosto dessa música, substituiria ela facilmente por Sweet Virginia e passaria cantando a música chiclete, mais chiclete do rock n’ roll até o final do mês. Então veio Honky Tonk Women, que é uma música super dançante mas que na noite 2 de março em Porto Alegre não foi tudo isso.

O show visto da ótica “stoniana” é perfeito em todos os sentidos possíveis. Mas se você tiver na cabeça a apresentação ao vivo de Bridges to Babylon em que, assim como no show do Franz Ferdinand, não há como parar de dançar nem que você queira muito, a apresentação em Porto Alegre decepciona um pouco. Apesar de ser uma banda muito mais antiga que Franz, essa característica dançante aproxima muito os dois conjuntos. E é uma característica adotada recentemente pelos Stones, pois nenhum disco de estúdio deles é dançante. Stones é uma banda para ser ouvida ao vivo.

As tradicionais duas músicas com Keith Richards nos vocais são impecáveis, mas são o momento que se você estivesse ouvindo eles no 512 certamente você pegaria mais uma cerveja para voltar a dançar mais tarde. Mas ali no meio da multidão não tem como fazer isso, por motivos práticos. Então vem um longo e cansativo Midnight Rambler, quase nada dançante.

Na 12ª música do show os Stones trazem o pique de volta com Miss You, e aí seguem até o final, com vocais arrasadores de Sasha Allen, daquele tipo que só uma voz negra consegue. A exceção é Sympathy for the Devil, uma música necessária, apesar de não ser dançante, mas que foi prejudicada pelo técnico de som nas duas entradas de Keith Richards, fazendo a guitarra dele se sobrepor a tudo e a todos e causando estranhamento aos ouvidos.

stones-porto-alegre

Ron Wood e Keith Richards (esquerda na foto) brincam no palco, tocam o tempo todo rindo, como se fosse fácil fazer o que eles fazem, entrosar duas guitarras de forma tão magnânima, e com afinação em Sol ainda por cima, só pra dar um tempero.

O final com Satisfaction é apoteótico, mas estranhos fogos de artifício saem de trás do palco e não atingem o céu, talvez pelo Beira-Rio ser rota de aviões. Assim termina um show irretocável no que diz respeito a uma banda de rock do tamanho dos Rolling Stones, um show digno de toda sua história, mas que em alguns momentos fez perder o pique. Nada que tirasse o brilhantismo da apresentação e sua importância para o currículo de um roqueiro. Apenas que algumas vezes não deu pra dançar.

vinicius de macedo

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Um Comentário

  1. Caramba. O cara só fala em dançar, dançar, dançante…isso é rock’n roll cacete!

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