No show de Porto Alegre o The Cult mostrou um vigor incomum para bandas do seu tempo. A apresentação foi curta, mas precisa. Bastante empolgante e muito intenso, o setlist de 14 músicas foi recheado pelos três principais discos da banda. Do disco novo, Hidden City, foram executadas três canções.
Ao contrário da maioria dos grupos de sua época, o The Cult parece não ter sofrido com a idade. Mesmo com os problemas do vocalista Ian Astbury com álcool, que contribuiram para o ostracismo do conjunto nos anos 90, a vitalidade da performance é marcante. Expressiva parcela das bandas com mais de 30 anos que apesar das indas e vindas se mantêm vivas até hoje, apresentam sinais visíveis do abuso de “sexo, drogas e rock n’ roll”. Pensando por esse lado é difícil entender como o The Cult não se tornou uma banda de estádios.
Desde 1984 foram dezenas de formações, ao ponto que apenas dois discos foram gravados consecutivamente com os mesmos integrantes. Além de Ian, o guitarrista Billy Duffy é o único membro original, mas isso não significa que não haja atrito, foi justamente um conflito entre eles que levou à dissolução completa da banda em 1994. Essa instabilidade somada a falta de identificação do grupo com um estilo pode justificar o fato do The Cult não estar no headline dos festivais. Predominantemente rotulado como hard rock, o próprio Ian diz não se identificar com esse estilo e já citou ter muito em comum com o grunge, por exemplo.
O reconhecimento do The Cult nos EUA começou em Seattle ainda em 1985, com o segundo álbum, Love. A banda tornou-se uma enorme influência para os jovens rebeldes daquela cidade que mais tarde dariam início ao grunge. Ian era amigo íntimo de Chris Cornell (Soundgarden) e Andrew Wood (Mother Loves Bone), um promissor vocalista que morreu de overdose antes de chegar ao estrelato. A fatalidade levou ao nascimento do Temple of the Dog, supergrupo formado por Chris com os membros da Mother Love Bone que contava ainda com Eddie Vedder nos vocais de apoio. O líder do Soundgarden, falecido em maio/17, foi homenageado por Ian no show do The Cult em Porto Alegre.
A versatilidade de Ian é um dos motivos de discussão com Duffy, o vocalista afirma que às vezes é preciso testar coisas novas para descobrir no que você é melhor. Filosofia que não era compartilhada pelo guitarrista e acabou trazendo problemas para o grupo nas gravações do terceiro disco, Electric. No entanto, o mesmo pensamento levou à criação do Festival Gathering of The Tribes, que inspirou o Lollapalooza.
Nem os grandes feitos da carreira de Ian, que incluem a enorme responsabilidade de substituir Jim Morrison na reunião do The Doors nos anos 2000, permitiram que o The Cult alcançasse o mesmo tamanho de grupos de hard rock como Guns n’ Roses e Kiss. Mas quem se importa? A performance da banda ao vivo é tão intensa que faz uma hora e meia de show parecer mais de duas, não deixando faltar nada, nem hits, nem empolgação.
Fotos: Gabriela Baum