Pro Dia Nascer Feliz, o musical – Resenha

Vinícius de Macedo

Cazuza era uma força da natureza. Como tal, capaz de morrer e surgir novamente. É isso o que o musical Pro Dia Nascer Feliz faz com Cazuza, o ressuscita. Embora Ezequiel Neves tentasse, ninguém conseguia parar Cazuza. Assim como ninguém pára um tsunami. Para fazer uma analogia um tanto clichê, Cazuza era uma estrela cadente. Estrela, pelo brilho que levava a todos. Cadente, pela rapidez que passou pela vida.

cazuza deitado no sofa pro dia nascer feliz

Cazuza foi o jovem que todos nós fomos algum dia, ou que pelo menos sonhamos em ser. Um libertino, um malandro carioca, um contestador que não cansava de correr na direção contrária. Cazuza batalhava por tudo o que os jovens da época sonhavam, e os de hoje também. Seu maior dom era traduzir a urgência das gerações do passado, do presente e do futuro. Tudo o que todo mundo queria dizer e que por algum motivo não podia ou não conseguia, estava no grito de Cazuza. Não é por nada que ele é considerado, ao lado de Renato Russo, um dos maiores poetas do país.

Cazuza era uma caricatura sem ser caricato. Ele era a personificação das vontades, dos desejos, da libido, da paixão e de todo comportamento jovem, não apenas dos anos 80, mas dos 70, dos 90 e dos 2000. Assistir ao musical Pro Dia Nascer Feliz faz lembrar de quando éramos tão jovens e nos dá uma vontade imensa de encher a cara de vinho barato à tarde e sonhar com sexo, drogas e rock and roll all nite. Só por provocar essa identificação o espetáculo já pode ser considerado, uma palavra que os críticos gostam muito de usar, arrebatador.

Não diria que o Cazuza interpretado por Emílio Dantas seja algo extraordinário. Daniel de Oliveira também o fez. Mas não posso tirar o mérito da atuação irretocável, que foi aprovada por por família e amigos do vocalista do Barão Vermelho, incluindo Ney Matogrosso. Mesmo não tendo vivido na época de Cazuza, acredito que o conheço intimamente. Sua história, sua maneira de falar, seu comportamento avassalador, foram retratados tantas vezes e de forma tão similar, que sou levado a acreditar que estive lá.

Mas de tudo isso, os gestos do cantor, é o mais marcante em qualquer performance. Sempre displicente, sempre no estilo “dane-se o mundo” e mais do que tudo isso, aquele jeito de parar do Cazuza. Aquela perna relaxada com o joelho dobrado, enquanto a outra rígida, que quando não sustentava o corpo inteiro enquanto as mãos permanecem apoiadas na cintura, divide o peso com o braço apoiado em alguma coisa ou em alguém. Postura símbolo do despojado. Cativante.

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Embora os organizadores do musical Pro Dia Nascer Feliz digam ter realizado ampla pesquisa para construir o espetáculo, é possível ver com clareza no roteiro diversas passagens do livro Barão Vermelho – Por Que a Gente É Assim, escrito por Ezequiel Neves e Guto Goffi, com o auxílio de Rodrigo Pinto, jornalista e fã. Não que isso seja um demérito, mas tal referência não é citada nos releases da peça.

Outras duas coisas que chamam muito atenção na direção do musical são o cenário e a coreografia. As soluções de cenário criadas para comportar tanta gente e tornar tantos ambientes possíveis com pouca estrutura são de extrema competência. Basta dizer que boa parte do espetáculo é feita inteiramente sobre uma estrutura de rampas e elevados, onde inúmeras ambientações são possíveis. O cenário enxuto facilita não só a turnê, reduzindo custos de transporte, como também ajuda a imprimir dinâmica aos acontecimentos. Uma dinâmica capaz de nos aproximar do ritmo acelerado de Cazuza e ainda colocar mais de 10 atores no palco cantando e dançando harmonicamente, coreografados perfeitamente.

O musical Pro Dia Nascer Feliz nos traz mais uma representação cativante de Cazuza e como qualquer biografia de personagens de sucesso, é inspiradora. Mais do que tudo, uma revelação rasgada do comportamento que todos os jovens um dia já tiveram, e por isso, nostálgica. Ao invocar tantos sentimentos, o espetáculo é imperdível. Assim como Cazuza foi em vida.

Para saber mais sobre a terceira passagem de Cazuza por Porto Alegre, acesse:

Musical sobre Cazuza tem apresentação aberta ao público

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